No dia 14 de março, o Brasil comemora o Dia Nacional da Poesia, uma data que remete à riqueza da literatura brasileira e à capacidade única da poesia de captar emoções, transformar realidades e gerar reflexões profundas. A data foi estabelecida para celebrar o nascimento de um dos maiores poetas do país, Castro Alves, que se destacou no movimento romântico e é lembrado até hoje por sua luta abolicionista.
A poesia, como linguagem artística, pode ser vista como uma ferramenta de resistência, reflexão, de questionamento e de afirmação de identidade. Hoje, ela se faz presente não só nos livros e nos poemas declamados, mas também em diversos espaços digitais, nos quais os jovens têm se expressado de maneira criativa e inovadora. O movimento da poesia digital, por exemplo, se fortalece nas redes sociais, mostrando que a poesia está mais viva do que nunca, adaptando-se aos tempos modernos, sem perder sua essência.
Para a professora Vera Lúcia Paganini, docente de Letras e Literatura da UnU Inhumas da Universidade Estadual de Goiás (UEG), o Dia Nacional da Poesia é uma recordação de como as artes engrandecem a cultura através dos tempos. “O 14 de março é considerado o Dia Nacional da Poesia. Essa escolha é uma homenagem ao dia do nascimento de um grande poeta brasileiro, Castro Alves. Claro que muito merecido porque, além de um grande poeta, foi um homem admirável com as causas sociais. Um abolicionista apaixonado. Mas se fôssemos homenagear por qualidade poética, teríamos muitos dias nacionais da poesia. Isso nos engrandece como povo e nos coloca em posição privilegiada no panteão das artes poéticas. Cultivar as artes em geral e a poesia em particular é uma das formas mais sensíveis de ensinar as crianças a olhar o mundo com amor. Para Guimarães Rosa, para entender a poesia é preciso ter a inocência no olhar e 'não entender, não entender, até virar criança'", explica a professora.
Em Goiás, são diversos os representantes da arte poética em suas variadas manifestações e fases. Desde Leodegária de Jesus, a primeira mulher a lançar um livro em Goiás, passadando por Cora Coralina, até a poesia transgressora de Tagore Biran e o lirismo refinado de Gilberto Mendonça Teles. Abaixo, três poemas de autores goianos que ilustram as qualidades e potencialidades da nossa cultura:
O POETA
Yeda Schmaltz
O poeta torna eterna
a coisa que se acaba:
é uma luz
de lanterna,
escolhendo os focos.
O poeta seduz
e atinge a glória,
para ser consumido
pela inveja
dos que não têm asas
nem história.
O poeta é um ritual
de sacrifício
buscando, embevecido,
o imbuscado.
É um danado, o poeta
e seu nome:
vive de palavra
e morre de fome.
VERSO AVESSO
Hélverton Baiano
Por andar em seus tropeços
Esmerando em criar hospícios
Vai marretando auspícios
Sem saber onde é o começo.
Por viver só pelo preço
Que pagou pra ter só isso
Cumpriu seu descompromisso
Se recompondo ao avesso.
Cheio de ausências seu berço
Engoliu mil sacrifícios
Quis furar vãos orifícios
Por apagar seus apreços.
Por mais deliberar regressos
E pelo prazer de seus vícios
Fez aparecer seus sumiços
No verso avesso do inverso.
PRÓLOGO
Tagore Biram
Chegou a hora de incendiar as palavras
e atiçar fogo na noite escura.
Ah, erga-se o facho das estrelas
nesta noite de puro abril:
eu quero a luz derramada
sobre a chaga do meu peito
e a sangria de minhas mãos à mostra.
E não me venham dizer que não é tempo
de falar de flores e que
passou-se o tempo de falar de amores.
Eu, do meu lado, não me cansei ainda
de amar com o meu amor desesperado
(Mesmo não havendo intervalo
no calendário de minhas dores).
Mesmo que me digam: “Não é tempo de falar de amores”,
eu viro as costas e não me importo
e abro as portas dos meus tumores.
Tudo que habita na retina do meu olhar
são os passos largos do barco fundo
no mar imenso do procurar.
Esta noite, sob o manto das estrelas,
erguerei o incêndio das palavras!
Venham todos assistir o grande espetáculo.
Não vês, na vidraça dos meus olhos,
uma colméia de abelhas? Uma centelha
desesperada, debulhando raios de luz?
Eis o prenúncio de um grande acontecimento.
(Não haverá gozo nem sofrimento,
mas a explosão da lucidez de um louco).
Venham todos! Vou incendiar o mundo
com um só dos meus olhares.
(Eu mesmo sou uma aldeia
e o meu coração pode matar a sede
de todos os mares).
Ah, eu peço pelo amor de Deus ou do demônio:
Abram as comportas do mundo.
Façam silêncio por um segundo:
aqui existe um homem incendiado
de amor e um coração que vai saltar
pela janela do peito!
(Comunicação Setorial|UEG, com informações do CriaLab)