Eliane me recebe em sua casa perto da hora do almoço. Somos recebidos com um cheirinho gostoso de comida caseira e com o carinho dos cachorros. Como muitas mulheres, Eliane tem jornada dupla: a de dona de casa e a de estudante. Os filhos estão na escola e ela foi gentil o suficiente para dar uma pausa no serviço e nos contar a sua história.
Foi possível notar o nervosismo dela assim que abriu a porta. A minha impressão é que ela nunca havia dado uma entrevista antes. Mais que isso, penso que ela acreditava que nunca daria uma entrevista em sua vida. Como se não tivesse nada para falar, como se sua história não fosse digna de ser contada.
Eliane é casada com Daniel, que é servidor da UEG e meu colega da Comunicação Setorial. Pensei que esse vínculo mais próximo talvez pudesse tranquilizá-la ou deixá-la mais à vontade. Na verdade, ela só foi se soltando ao longo da conversa, quando teve a oportunidade de contar sua relação com a universidade e com a educação.
Eliane vem de uma família humilde. Seus pais não chegaram a concluir o ensino fundamental. Chegar à universidade era, portanto, um sonho distante. Tanto que ela não seguiu a trajetória mais tradicional de cursar o ensino superior na sequência do término do ensino médio. Primeiramente, ela constituiu família e só aos 37 anos entrou no curso de Pedagogia.
A UEG era a escolha óbvia. O esposo, além de servidor, é também egresso da universidade e serviu de inspiração para ela. “O Daniel sempre falou para mim da UEG com muita paixão. Isso e o ensino gratuito e de qualidade foi o que me incentivou a querer fazer parte desse mundo”, conta.
Ela escolheu a Pedagogia por conta da sua relação com as crianças. Ela gosta e leva jeito com elas. “Escolhi esse curso porque ele se encaixa com a minha personalidade e até me ajuda com as minhas crianças. Me trouxe um embasamento teórico para enxergar as crianças de uma outra maneira”, relata.
Entrar no ensino superior é, para Eliane, mais do que obter um diploma ou um status. É ainda mais do que receber uma formação universitária. O acesso à universidade representa, para ela, a conquista de um espaço até então impossível e inimaginável. Chegar à universidade é, nesse sentido, libertador. Significa um novo olhar para si mesmo, de acreditar no seu próprio potencial.
É nesse momento que sinto Eliane mais a vontade. Acho que ao verbalizar essa reflexão, a confiança chega à superfície. Ela se sente confortável para contar sua história, com orgulho de cada detalhe. O acesso à universidade legitima a autoestima de Eliane.
“Eu vim de uma família em que eu não tinha lugar de fala. Meus pais eram muito simples – hoje, a gente interage com a criança, a gente conversa, pergunta tudo. Eu era mais calada. Estou me superando a cada dia e a UEG faz parte disso, dessa superação, dessa nova Eliane que está florescendo, com mais autoestima, com mais conhecimento”, fala.
“Estou me superando a cada dia e a UEG faz parte disso, dessa superação, dessa nova Eliane que está florescendo, com mais autoestima, com mais conhecimento”
A história da Eliane exemplifica bem a missão da UEG que, além de oferecer educação superior pública, gratuita e de qualidade aos goianos, garante empoderamento a uma população que sequer cogitava entrar na universidade. “Tanto eu quanto meu esposo viemos de famílias humildes. Hoje, a nossa qualidade de vida melhorou, temos uma visão de mundo mais ampla. Só de estar na sala de aula, você vê o tanto que ela impacta positivamente na vida de todos que estão ali”, argumenta.
Ao falar das aulas, não faltam elogios aos professores e à turma. Ela, como futura professora, consegue, além de absorver os conteúdos, se espelhar na didática e nas características específicas de cada professor. “É incrível. Todos os professores são muito bem qualificados. Com cada professor, tenho uma experiência diferente que me inspira”, conta.
Eliane sonha com a formatura, quer poder levar a mãe e mostrar seu diploma a ela. A mesma mãe que não teve oportunidades de estudo e que não compreende muito bem a dinâmica do ensino universitário… “Às vezes, minha mãe me liga e pergunta: ‘você já chegou aí na escola?’, sorri. Quero que ela me veja ali, me graduando, de beca. Eu vou sentir muito orgulho de ser a primeira da minha família a concluir o ensino superior”, destaca.
Eliane conta que a graduação é apenas o seu primeiro passo na universidade. Ela compartilhou os planos de ingressar no mestrado assim que se formar, pois deseja seguir carreira acadêmica. Ela quer fazer seus estudos de pós-graduação na UEG e, a exemplo de muitos dos seus professores que também são egressos, pensa em ser docente da instituição um dia.
Encerramos a nossa conversa e enquanto desmontamos o equipamento de gravação, o casal de filhos chega da escola. Os dois fazem questão de vir até nós e nos cumprimentar, o que me chama a atenção. As crianças de hoje tendem a mergulhar num universo de telas e em raras exceções são tão educadas e comunicativas. Eliane e Daniel têm acertado em cheio na criação desses meninos.
Recebemos um convite para ficarmos para o almoço. Em função do adiantado da hora, não podemos ficar. O cheiro de comida caseira que permeou toda a nossa conversa parece ter se intensificado naquele momento. Eliane, que nos recebeu tão bem, parece ficar frustrada por não poder completar seu papel de anfitriã. Fico com a sensação que eu consegui tudo o que eu precisava, mas ela não.
Prometo voltar em outra ocasião e ficar para o almoço, dessa vez sem microfones.