Você já imaginou como os surdos, no decorrer de uma disputa esportiva, podem ter conhecimento das decisões dos árbitros, que normalmente são sonoras (com uso, por exemplo, de apitos e sirenes) auxiliadas por gestos? Foi pensando nessa dificuldade que um projeto desenvolvido na Universidade Estadual de Goiás (UEG) trabalha para minimizar a exclusão dos surdos das aulas práticas de Educação Física, treinos e campeonatos, reduzindo a dificuldade de comunicação.
Denominado de JVISUAL, o equipamento foi desenvolvido pelo aluno Epaminondas Rodrigues da Cruz Júnior dentro do mestrado profissional em Ensino de Ciências da UEG (PPEC|UEG), no Câmpus Central, em Anápolis. Ele foi orientado pelo professor Clodoaldo Valverde.
O equipamento é utilizado em partidas de futsal, podendo ser usado também em outras modalidades esportivas. Com a utilização do aparelho na quadra durante as partidas, o jogador surdo tem a visualização das decisões do árbitro. Um dispositivo é colocado na bandeira do árbitro. "Quando o árbitro levanta a bandeira e aciona o dispositivo, uma luz se acende e atrás do gol aparece uma sinalização luminosa, fazendo com que o jogador entenda que há uma interrupção", esclarece.
O equipamento foi testado pela primeira vez durante o campeonato Goiano de Futsal, em janeiro de 2019, na cidade de Anápolis. "Constatamos que as luzes dos sinalizadores (Giroflex) no ambiente do ginásio não trouxeram a luminosidade suficiente. Na tentativa de melhorar a funcionalidade do equipamento, foram trocados os sinalizadores por mangueiras de led redondas que trouxeram o resultado esperado", completa.
Durante o Campeonato Brasileiro de Futsal de Surdos, realizado em abril de 2019, em Cascavel, no Paraná, houve uma demonstração do equipamento. Aprovado pelos árbitros e atletas, a Confederação Brasileira de Desportos de Surdos resolveu utilizar o aparelho nas Surdolimpíadas 2019, realizado em Pará de Minas (MG), no mês de junho de 2019, quando beneficiou as competições de natação e atletismo. O equipamento também poderia ter sido utilizado em jogos de basquete, voleibol e handbol, mas, segundo Epaminondas, como havia apenas um aparelho e os jogos eram simultâneos, isso não foi possível.
A criação
Atuando há muitos anos como professor de Educação Física e como intérprete de pessoas portadoras de deficiência auditiva, Epaminondas se sentiu motivado a criar o JVISUAL. Segundo ele, nas aulas de Educação Física precisava chamar a atenção de surdos durante as partidas.
A primeira etapa para o desenvolvimento do equipamento foi uma pesquisa em escolas que tinham a presença de surdos. Além das escolas, foi analisado também um grupo de surdos que treinam futsal na Associação dos Surdos de Goiânia. Num segundo momento, foram analisadas quais dificuldades eram enfrentadas pelo aluno surdo nos treinos de futsal. "Logo após a coleta de dados e levantamento da problemática, desenvolvemos o JVISUAL", destaca Epaminondas.
A necessidade inicial foi criar algo que pudesse auxiliar os professores. Mas a dificuldade não foi encontrada somente no ambiente educacional: "Fui até a Associação de Surdos e, em treinos dos atletas, acompanhados por técnicos surdos, foi constatada essa dificuldade. Então, fui convidado para ser auxiliar técnico da equipe masculina e, chegando ao Campeonato Goiano de Futsal, encontrei a dificuldade enfrentada pelos árbitros", relata.
A proposta de criação de um equipamento que minimizasse o problema foi apresentada para a Federação Goiana de Desporto Surdo, que aprovou a ideia. Depois de ser testado e aprovado no Campeonato Brasileiro de Futsal de Surdos, no primeiro semestre do ano passado, no Paraná, o JVISUAL caiu no gosto de quem é atleta portador de deficiência auditiva e de quem trabalha com eles.
O presidente da Federação Goiana de Desporto dos Surdos, Hiram Alcântara de Moura, elogia a iniciativa de Epaminondas. "O equipamento é ótimo para acessibilidade para surdoatletas e melhora consideravelmente a comunicação com os surdos nas modalidades esportivas, como o futsal", diz.
A jogadora de futsal da Associação dos Surdos de Goiânia, Giselly Ribeiro de Morais, 22 anos, também aprovou o instrumento de comunicação. "Tive acesso ao aparelho e vi que o inventor foi muito criativo. Adorei. Já nos ajuda muito", ressalta.
Segundo Epaminondas, a invenção tem chamado a atenção de várias instituições, que têm demonstrado interesse em adquirir o aparelho, mas, por enquanto, existe apenas um protótipo que está na UEG. Epaminondas diz que entre o desenvolvimento e a produção, o custo do equipamento é de R$ 1.500.
O processo de registro da patente do JVISUAL está em andamento no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi). Recentemente, Epaminondas conseguiu pagar a guia e aguarda com ansiedade o resultado. "A nossa esperança é que consigamos a patente e investidores que tenham interesse em produzir em larga escala e beneficiar um grande número de pessoas", diz.
(Dirceu Pinheiro|Comunicação Setorial|UEG)